
Você já parou para pensar como a forma de interpretar a Bíblia influenciou os rumos da história da humanidade? Neste artigo, faço uma viagem pelas páginas das Escrituras e pelos acontecimentos que moldaram culturas, leis e a fé de gerações. Um conteúdo profundo, com linguagem clara, que conecta passado e presente à luz da Palavra de Deus.
Introdução abrangente: a busca por interpretação bíblica
A Bíblia Sagrada. Para bilhões de pessoas ao redor do globo, ela representa a palavra inspirada de Deus, um farol de esperança, um guia moral e uma fonte inesgotável de sabedoria espiritual. Suas histórias moldaram civilizações, inspiraram obras de arte monumentais e ofereceram consolo em tempos de profunda adversidade. No entanto, para muitos leitores contemporâneos, tanto crentes quanto céticos, a Bíblia também se apresenta como um enigma complexo, um vasto compêndio de textos antigos escritos ao longo de mais de um milênio, em contextos culturais e históricos radicalmente diferentes dos nossos.
Mergulhar em suas páginas é encontrar não apenas narrativas edificantes e ensinamentos profundos, mas também passagens que desafiam nossa compreensão, relatos que parecem contraditórios, descrições de violência que chocam a sensibilidade moderna e dilemas éticos que nos deixam perplexos.
Você já se sentiu desconfortável ao ler certas passagens do Antigo Testamento? Já se perguntou como conciliar a imagem de um Deus amoroso com ordens de destruição? Já notou aparentes discrepâncias cronológicas ou teológicas entre diferentes livros ou mesmo dentro do mesmo livro? Se sim, saiba que você não está sozinho. Essas questões não são novas; elas têm sido debatidas por teólogos, historiadores e leitores atentos por séculos. Longe de ser um sinal de fraqueza espiritual ou intelectual, a coragem de fazer perguntas difíceis e o desejo sincero de compreender as complexidades das Escrituras podem ser, na verdade, o ponto de partida para uma jornada de fé e entendimento muito mais rica, madura e resiliente.
Este artigo pilar se propõe a ser um guia nessa jornada exploratória. Não pretendemos oferecer respostas fáceis ou dogmáticas, nem temos a intenção de minimizar as dificuldades reais que o texto bíblico apresenta. Pelo contrário, nosso objetivo é mergulhar de forma honesta, respeitosa e academicamente informada nas questões mais espinhosas que cercam a interpretação bíblica. Investigaremos a fascinante história da formação do cânone bíblico, desde suas raízes na tradição oral até a compilação dos livros que conhecemos hoje. Exploraremos a diversidade de seus autores humanos como: sacerdotes, reis, profetas, pescadores, médicos, e como seus contextos, estilos e propósitos influenciaram os textos que produziram sob a inspiração divina.
Enfrentaremos de frente as chamadas “contradições”, examinando-as não como meros erros a serem descartados, mas como possíveis paradoxos, tensões narrativas ou diferenças de perspectiva que, quando analisadas à luz do contexto histórico, cultural e literário apropriado, podem revelar camadas mais profundas de significado. Discutiremos o desafiador tema da violência no Antigo Testamento, buscando compreendê-lo dentro das convenções literárias e da realidade brutal do Antigo Oriente Próximo, sem, contudo, ignorar o desconforto moral que ele provoca. Abordaremos também as tensões teológicas, como a relação entre Lei e Graça, ou Fé e Obras, mostrando como diferentes autores bíblicos enfatizaram aspectos distintos da revelação divina em resposta a contextos e desafios específicos.
Mais importante ainda, forneceremos ferramentas e princípios hermenêuticos, a arte e ciência da interpretação, que podem nos ajudar a navegar por essas águas turbulentas. Aprenderemos sobre a importância crucial de considerar o contexto histórico e cultural, de reconhecer os diversos gêneros literários presentes na Bíblia (história, poesia, profecia, carta, apocalipse) e de buscar o significado original pretendido pelos autores para seus primeiros leitores. Veremos como a arqueologia, a linguística e outras disciplinas podem iluminar nossa compreensão do texto.
Esta exploração nos convida a abraçar a complexidade inerente à Bíblia, reconhecendo-a como um livro simultaneamente divino e humano – um registro da revelação progressiva de Deus que se desenrola dentro da tapeçaria da história humana, com todas as suas nuances, lutas e ambiguidades. Ao final desta jornada, esperamos que você, seja um crente buscando aprofundar sua fé ou um cético buscando entender um texto fundamental da cultura ocidental, possa ter uma apreciação mais informada e matizada da Bíblia, reconhecendo sua extraordinária riqueza e sua contínua relevância para as grandes questões da vida humana.
Introdução
A Bíblia. Para muitos, um livro sagrado, fonte de inspiração, conforto e orientação divina. Para outros, um texto antigo, repleto de passagens obscuras, aparentes contradições e relatos de violência que desafiam a sensibilidade moderna. Se você já se deparou com versículos que parecem conflitar entre si, narrativas que chocam pela brutalidade ou dilemas morais que o deixaram perplexo, saiba que você não está sozinho. Longe de ser um sinal de fraqueza na fé, a dúvida honesta e o desejo de compreender as complexidades das Escrituras podem ser o início de uma jornada mais profunda e significativa de entendimento.
Neste artigo, não fugiremos das sombras. Mergulharemos de forma honesta e respeitosa em algumas das questões mais espinhosas que a Bíblia apresenta: as chamadas contradições cronológicas e morais, a perturbadora presença da violência no Antigo Testamento e as tensões teológicas que parecem emergir de suas páginas.
Desde que me entendo por gente, sempre ouvi dizer que a Bíblia foi escrita por “homens inspirados por Deus”. Mas… quem eram eles, de fato?
A resposta é fascinante, complexa e muito mais rica do que normalmente é contado nos púlpitos.
Nosso objetivo não é oferecer respostas simplistas ou descartar as dificuldades, mas sim fornecer ferramentas, contexto histórico e perspectivas que permitam uma análise mais informada e madura. Convidamos você a embarcar nesta exploração, não com medo do que pode encontrar, mas com a coragem de questionar e a esperança de alcançar uma compreensão mais rica e resiliente da mensagem bíblica e de sua relevância para nossos dias.
A origem dos escritos bíblicos na interpretação bíblica
A Bíblia não nasceu de uma canetada divina. Os primeiros textos surgiram em uma cultura oral, onde as histórias eram transmitidas de geração em geração. Foi só por volta de 1200 a.C., com o surgimento do alfabeto hebraico primitivo, que começaram a ser escritos registros como cânticos, genealogias e leis.
Você sabia que muitas histórias da Bíblia foram preservadas por séculos apenas na memória antes de serem escritas? Valorize a tradição oral da sua família. Converse mais, conte histórias, mantenha sua herança viva.
Quem foram os autores?
O Antigo Testamento (ou Tanakh, para os judeus) foi escrito ao longo de aproximadamente 1000 anos. Autores variados: sacerdotes, reis, profetas e escribas, foram responsáveis pelos textos, cada um trazendo seu contexto, seus interesses e seus desafios.
Moisés é tradicionalmente creditado pela Torá (os cinco primeiros livros da Bíblia), mas a análise acadêmica moderna, conhecida como Teoria Documentária, sugere a compilação a partir de várias fontes distintas (identificadas como J, E, D, P) ao longo de séculos.
Salomão, conhecido por sua sabedoria, é tradicionalmente associado à autoria de parte dos Provérbios, Eclesiastes e Cântico dos Cânticos.
Profetas como Isaías, Jeremias, Ezequiel e os doze profetas menores registraram oráculos, visões e narrativas históricas relacionadas aos eventos de seu tempo, frequentemente abordando questões de justiça social, idolatria e a aliança de Deus com Israel.
A Bíblia não é apenas “um livro”. É uma biblioteca viva, com múltiplos autores, estilos e contextos. Comece a ler livros diferentes com olhos curiosos, buscando entender quem estava falando, para quem e por quê.
O Novo Testamento: Testemunhas oculares e escritores tardios
Os escritos do Novo Testamento – evangelhos, cartas (epístolas) e o Apocalipse – surgiram em um período muito mais curto, aproximadamente entre 50 d.C. e 100 d.C..
É importante notar que muitos dos autores do Novo Testamento, como Lucas e o autor de Hebreus, não conheceram Jesus pessoalmente. Eles basearam seus relatos em:
- Tradições orais: Histórias e ensinamentos sobre Jesus que circulavam nas primeiras comunidades cristãs.
- Pregações apostólicas: O testemunho dos apóstolos que conviveram com Jesus.
- Documentos anteriores: Acredita-se que os evangelistas Mateus e Lucas utilizaram fontes comuns, incluindo o Evangelho de Marcos e uma hipotética coleção de ditos de Jesus conhecida como “Fonte Q” (do alemão Quelle, que significa “fonte”).
Descoberta Arqueológica Relevante: Embora não diretamente ligados ao Novo Testamento, a descoberta dos Manuscritos do Mar Morto em 1947 foi crucial. Eles continham cópias de textos do Antigo Testamento datando de antes da era cristã, demonstrando tanto a notável precisão na transmissão dos textos ao longo dos séculos quanto a existência de pequenas variações textuais, um fenômeno natural em qualquer processo de cópia manual.
Ponto de Reflexão: Antes de julgar ou interpretar apressadamente um texto sagrado, lembre-se: ele passou por séculos de transmissão oral, escrita, cópia, interpretação e tradução. Aprofundar o estudo desses processos enriquece nossa compreensão.
Uma história contada pelo povo: O escriba escondido
Em uma pequena vila judaica do século III a.C., havia um escriba chamado Ezequias. Sua missão era copiar os Salmos. Um dia, os inimigos atacaram a cidade. Ezequias, ao invés de fugir, escondeu os pergaminhos em uma caverna, acreditando que preservar a palavra era mais importante que salvar sua própria vida. Séculos depois, arqueólogos encontraram fragmentos de textos semelhantes.
Moral da história: O verdadeiro valor de uma mensagem ultrapassa gerações, guerras e impérios.
Interpretação bíblica e as “contradições” que aparentam
Quando falamos em “contradições bíblicas”, estamos diante de um tema que frequentemente causa desconforto entre os fiéis e é usado como munição por críticos. Mas o que realmente constitui uma contradição? No sentido lógico estrito, uma contradição ocorre quando duas afirmações não podem ser simultaneamente verdadeiras no mesmo sentido e contexto. No entanto, muitas das passagens bíblicas rotuladas como “contradições” podem ser melhor compreendidas como:
- Paradoxos: Verdades aparentes que parecem contraditórias, mas que podem coexistir ou apontar para uma realidade mais profunda (ex: a natureza divino-humana de Cristo).
- Tensões Narrativas: Diferentes relatos do mesmo evento que enfatizam aspectos distintos ou seguem convenções literárias diferentes (ex: os relatos da ressurreição nos evangelhos).
- Diferenças de Perspectiva: Autores diferentes abordando temas semelhantes com ênfases ou propósitos teológicos distintos (ex: Paulo e Tiago sobre fé e obras).
- Desenvolvimento Progressivo: A revelação de Deus na Bíblia não foi estática, mas se desdobrou ao longo do tempo, levando a mudanças de ênfase ou compreensão (ex: a ética do Antigo Testamento vs. os ensinamentos de Jesus).
Examinar essas aparentes discrepâncias em seu contexto histórico, cultural e literário muitas vezes revela camadas mais profundas de significado, em vez de simples erros.
Do desafio cronológico à interpretação bíblica
Um dos exemplos mais citados de aparente contradição cronológica encontra-se nos relatos do nascimento de Jesus. Enquanto Mateus situa o nascimento durante o reinado de Herodes, o Grande (que morreu em 4 a.C.), Lucas menciona que ocorreu durante o censo ordenado por Quirino, governador da Síria (tradicionalmente datado em 6 d.C.). Esta discrepância de aproximadamente dez anos tem sido fonte de intenso debate acadêmico.
Para compreender esta questão, precisamos considerar:
Fontes Externas: O historiador judeu Flávio Josefo fornece informações valiosas, mas suas próprias cronologias também apresentam desafios interpretativos.
Historiografia Antiga: Os evangelhos não são biografias modernas com precisão cronológica como foco principal. São testemunhos teológicos que organizam o material para destacar aspectos específicos do significado de Jesus. Mateus foca nas profecias messiânicas para uma audiência judaica, enquanto Lucas enfatiza o alcance universal da mensagem para um público helenístico.
Complexidade dos Censos Romanos: Pesquisas e inscrições arqueológicas sugerem que os censos romanos eram processos complexos que podiam levar anos para serem concluídos, especialmente em províncias distantes. Há evidências que sugerem que Quirino pode ter tido envolvimento administrativo na região em um período anterior ao governo de 6 d.C., ou que o censo mencionado por Lucas pode ter sido um registro iniciado antes, mas concluído ou formalizado mais tarde. Para mais detalhes, veja nosso artigo sobre o Censo de Quirino e a Cronologia do Nascimento de Jesus.
Outros enigmas cronológicos (sequência de eventos, genealogias, narrativas da ressurreição) também podem ser compreendidos ao reconhecer que os autores bíblicos frequentemente organizavam seu material tematicamente, não estritamente cronologicamente, uma prática literária comum na antiguidade.

O dilema da interpretação bíblica: A violência no Antigo Testamento sob escrutínio
Talvez nenhum aspecto da Bíblia cause mais perplexidade ao leitor moderno do que os relatos de violência, especialmente aqueles que parecem sancionados por Deus no Antigo Testamento. A conquista de Canaã, com ordens de destruição completa (herem), os salmos imprecatórios que clamam por vingança divina, e leis que parecem excessivamente severas desafiam nossa sensibilidade ética.
Para abordar este dilema complexo, é crucial considerar:
Revelação em Contexto: Como observa o rabino Jonathan Sacks, a revelação ocorre “na linguagem dos homens”, dentro de contextos históricos específicos. A violência refletida pode ser vista mais como parte do cenário histórico da revelação do que como um ideal divino atemporal.
Contexto Histórico-Cultural: O Antigo Oriente Próximo era um mundo brutal, marcado por violência endêmica e guerras constantes. A sobrevivência de pequenos povos como Israel estava frequentemente ameaçada. A linguagem de guerra na época era frequentemente hiperbólica (exagerada), com reis alegando destruição total mesmo quando a ocupação continuava.
Interpretação da “Guerra Santa”: A teologia por trás dessas guerras era complexa, inserida num contexto politeísta onde a soberania de Yahweh era afirmada. Essas não eram guerras de conquista arbitrária, mas vistas como julgamentos divinos contra práticas consideradas abomináveis (ex: sacrifício infantil). No entanto, a tensão moral permanece. Muitos teólogos veem essas passagens como parte de uma revelação divina progressiva, que encontra seu ápice nos ensinamentos de Jesus sobre amor aos inimigos. Explore mais sobre este tópico em nosso artigo dedicado às Guerras Santas na Bíblia: Uma Análise Contextual.
Evidências Arqueológicas: Estudos em locais como Jericó e Ai mostram uma imagem mais complexa do que uma destruição literal e completa, sugerindo que as narrativas bíblicas podem usar convenções literárias da época.
Vozes Internas de Crítica: A própria Bíblia contém vozes que questionam a violência e apontam para um futuro de paz (ex: Isaías 2:4 – “converterão suas espadas em arados”). Essa tensão interna é parte da riqueza e complexidade do texto.
Tensões teológicas da interpretação bíblica: Lei vs. graça, fé vs. obras
Outra área de aparente tensão envolve as diferentes ênfases teológicas dentro da própria Bíblia, particularmente a relação entre Lei e Graça, e Fé e Obras.
- Paulo vs. Tiago: O apóstolo Paulo enfaticamente declara que a justificação (ser considerado justo diante de Deus) vem “pela fé, sem as obras da lei” (Romanos 3:28), combatendo um legalismo que buscava a salvação por mérito próprio. Por outro lado, Tiago afirma que “a fé sem obras é morta” (Tiago 2:26), combatendo uma fé meramente intelectual que não se traduzia em ações práticas de amor e justiça (antinomianismo).
- Lei e Graça: O Antigo Testamento enfatiza a importância da Lei (Torá) dada por Deus a Israel. O Novo Testamento proclama a salvação pela graça através de Jesus Cristo. Essa tensão não é necessariamente uma contradição, mas um desenvolvimento. Jesus não veio abolir a Lei, mas cumpri-la (Mateus 5:17), levando seus princípios morais à plenitude e reinterpretando seus aspectos civis e cerimoniais à luz de sua vinda.
Essas tensões refletem diferentes contextos pastorais e ênfases teológicas. Compreender a relação entre Lei vs. Graça no Cristianismo é fundamental. A diversidade de vozes, como observa N.T. Wright, não é um defeito, mas reflete a riqueza da revelação divina ocorrendo na história através de pessoas e situações reais.
Em águas turbulentas: Ferramentas de Interpretação bíblica
Diante das complexidades e desafios que a Bíblia apresenta, como podemos desenvolver uma abordagem interpretativa que seja tanto intelectualmente honesta quanto espiritualmente frutífera? Quais ferramentas e princípios podem nos ajudar a navegar por estas águas turbulentas sem naufragar na dúvida ou no dogmatismo simplista? A Hermenêutica Bíblica, a ciência e arte da interpretação, oferece princípios cruciais.
Interpretação bíblica: Contexto histórico e cultural
O primeiro princípio fundamental para interpretar passagens difíceis é reconhecer a distância histórica e cultural que nos separa dos textos bíblicos. A Bíblia foi escrita ao longo de aproximadamente 1.500 anos, em três continentes, por dezenas de autores, em contextos culturais radicalmente diferentes do nosso. Ignorar esta realidade é convidar ao anacronismo e à má interpretação.
Exemplo 1: “Submissão das Mulheres”: Quando lemos sobre a “submissão das mulheres” nas epístolas paulinas (ex: Efésios 5:22), precisamos compreender o contexto patriarcal greco-romano em que estas palavras foram escritas. Estudos históricos revelam que as instruções de Paulo eram, em muitos aspectos, surpreendentemente progressistas para sua época, elevando o status das mulheres em comparação com as normas culturais predominantes, ao mesmo tempo que trabalhavam dentro das estruturas sociais existentes.
Exemplo 2: Escravidão no Antigo Testamento: Da mesma forma, as leis do Antigo Testamento sobre escravidão, embora chocantes hoje, representavam uma humanização significativa das práticas brutais da época, estabelecendo limites, proteções e caminhos para a libertação que eram revolucionários no contexto do Antigo Oriente Próximo.
O Papel da Arqueologia: A arqueologia tem sido uma aliada valiosa na reconstrução destes contextos. Descobertas como os Manuscritos do Mar Morto, as tábuas de Ebla e Ugarit, e códigos legais mesopotâmicos como o de Hamurabi fornecem janelas para o mundo em que os textos bíblicos foram compostos, iluminando passagens obscuras.
Humildade Interpretativa: Como observa o historiador Edwin Yamauchi, “o maior perigo na interpretação bíblica não é o que não entendemos, mas o que achamos que entendemos”. A humildade cultural e histórica é essencial para uma leitura responsável das Escrituras. Aprofundar-se nos princípios da Hermenêutica Bíblica é crucial.
Interpretação bíblica: Gêneros Literários
Um segundo princípio crucial é reconhecer e respeitar os diversos gêneros literários presentes na Bíblia. As Escrituras não são um livro monolítico, mas uma biblioteca que contém narrativa histórica, poesia, sabedoria, apocalíptica, parábola, epístola e muitos outros gêneros, cada um com suas próprias convenções e propósitos. Ignorar o gênero de uma passagem é um caminho certo para a má interpretação.
Narrativa Histórica: Livros como Gênesis, Êxodo, Samuel, Reis, Crônicas, Esdras, Neemias, Atos contam histórias sobre eventos passados, mas com propósitos teológicos específicos. Eles não são meros registros factuais, mas narrativas interpretativas que revelam o caráter de Deus e seu relacionamento com a humanidade.
Poesia: Os Salmos, Provérbios, Jó, Cântico dos Cânticos e partes dos profetas usam linguagem figurativa, paralelismo, metáforas e outras técnicas poéticas para expressar emoções, sabedoria e louvor. Interpretar poesia literalmente pode levar a conclusões absurdas.
Sabedoria: Provérbios, Jó e Eclesiastes exploram questões práticas e existenciais sobre a vida, o sofrimento, a justiça e o temor de Deus. Eles oferecem princípios gerais, não promessas absolutas.
Profecia: Livros como Isaías, Jeremias e Daniel contêm tanto predições sobre o futuro quanto, e principalmente, mensagens para o público original do profeta, chamando ao arrependimento e à fidelidade à aliança.
Apocalíptica: Partes de Daniel, Ezequiel e o livro do Apocalipse usam simbolismo vívido, imagens cósmicas e linguagem hiperbólica para comunicar verdades teológicas sobre a soberania de Deus, o conflito cósmico entre o bem e o mal, e a esperança em tempos de perseguição. Não foram escritos para serem decifrados como um código literal sobre eventos futuros.
Parábola: Jesus frequentemente usava parábolas – histórias curtas com um ponto principal – para ensinar verdades sobre o Reino de Deus.
Epístola (Carta): As cartas de Paulo, Pedro, João, etc., são correspondências reais escritas para comunidades ou indivíduos específicos, abordando questões concretas da época. Precisamos entender o contexto original para aplicar seus princípios hoje.
Exemplo de Interpretação por Gênero:
- Livro de Jó: Não é um tratado histórico ou científico sobre o sofrimento, mas uma obra poética que explora o mistério do sofrimento justo através de um diálogo dramático.
- Salmos Imprecatórios: Não são prescrições para odiar inimigos, mas expressões poéticas de lamento e clamor por justiça divina em situações de extrema opressão.
O estudioso bíblico Gordon Fee enfatiza que “o primeiro passo na interpretação é determinar o que o texto significava para seus destinatários originais”. Reconhecer o gênero literário é fundamental para isso. Um Guia Completo sobre Gêneros Literários da Bíblia pode ser útil.
Conclusão: Abraçando a complexidade, encontrando significado da interpretação bíblica
Nossa jornada através das aparentes contradições e passagens difíceis da Bíblia nos leva não a respostas simplistas, mas a uma apreciação mais profunda da riqueza e complexidade deste texto extraordinário. As tensões e desafios que encontramos não são necessariamente falhas a serem explicadas, mas características que refletem a natureza da revelação divina ocorrendo dentro da história humana, através de personalidades diversas e contextos culturais específicos.
Abordar a Bíblia exige mais do que simplesmente ler; exige interpretação – uma interpretação informada pelo contexto histórico, atenta aos gêneros literários e humilde diante da distância que nos separa dos autores originais. Reconhecer a Bíblia como uma biblioteca divina e humana nos permite valorizar tanto sua mensagem transcendente quanto as marcas de sua origem terrena.
Como escreveu o rabino Abraham Joshua Heschel, “a Bíblia não é um livro de teologia, mas um livro de vida”. Esta perspectiva nos convida a abordar as Escrituras não como um manual técnico de proposições a serem dissecadas, mas como um testemunho vivo do encontro dinâmico entre Deus e a humanidade ao longo do tempo.
As dificuldades que encontramos na Bíblia podem, paradoxalmente, enriquecer nossa compreensão e aprofundar nossa fé ou nosso entendimento. Elas nos desafiam a ir além de leituras superficiais, convidando-nos a um engajamento mais atento, contextualizado e humilde. Para o crente, as complexidades podem ser um convite a uma fé mais madura, que abraça o mistério e a nuance sem sucumbir à dúvida paralisante. Para o cético ou o buscador, elas oferecem uma oportunidade de engajamento honesto e sofisticado com um texto que moldou, e continua a moldar, profundamente nossa civilização.
Em última análise, as “sombras” e dificuldades na interpretação bíblica não precisam ser obstáculos intransponíveis. Com as ferramentas certas e uma postura de humildade e curiosidade, elas podem se tornar portais para uma compreensão mais rica e multifacetada da mensagem bíblica. Como escreveu o apóstolo Paulo, “agora vemos como em espelho, obscuramente, então veremos face a face” (1 Coríntios 13:12). Que nossa jornada contínua de interpretação seja marcada pela busca honesta da verdade, pela graça na compreensão das complexidades e pela transformação que o encontro com este texto extraordinário pode proporcionar.
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Empresário, cristão e autor dedicado à história da fé cristã.